sexta-feira, 17 de outubro de 2008



Libertação Gay e Feminismo Lésbico


"A opressão homossexual e a opressão das mulheres eram ambas vistas como resultado da imposição do que eram chamados de ‘papéis sexuais’. Ativistas políticos da esquerda nesse período eram profundamente construtores sociais em sua aproximação. Deste modo, ambos libertadores gays e feministas viam papéis sexuais, o que provavelmente são chamados agora de ‘papéis de gênero’, como sendo politicamente construídos para assegurar a dominância masculina. Mulheres foram relegadas ao papel sexual feminino da esfera privada, criando e sendo preocupadas com o embelezamento do corpo a fim de ser um apropriado objeto sexual. Lésbicas foram perseguidas por elas desafiarem o papel sexual da fêmea de passividade sexual e a servidão aos homens. Homens gays foram perseguidos por eles desafiarem o papel sexual do macho, que, assim como exige comportamento masculino, foi fundado na heterossexualidade e no intercurso sexual com mulheres.

No contexto de uma polític a queer corrente, que celebra aqueles que desempenham precisamente estes papéis na forma de butch/femme, transgenerismo e sadomasoquismo como a vanguarda transgressiva da revolução, é útil entender como uma libertação gay fortemente influenciada pelo feminismo os rejeitou completamente. A opressão dos homens gays foi vista como um reflexo da opressão das mulheres, então ‘papéis sexuais’ era um problema para homens gays também. Um gay liberacionista dos Estados Unidos expressou isso deste modo:

Sexismo também é refletido nos papéis que homossexuais têm copiado da sociedade heterossexual. Os rótulos podem variar, mas é a mesma situação desigual, contanto que os papéis estejam rigidamente definidos, contanto que uma pessoa exerça poder sobre outra. Para héteros é macho-fêmea, senhor/senhora. Para gays é butch/femme, ativo-passivo. E o extremo, em cada caso, é sadista-masoquista. Seres humanos são objetificados, tratados como propriedade, como se uma pessoa pudesse possuir outra. (Diaman 1992: 263)

Um ativista da libertação gay do Reino Unido escreveu: ‘Nós temos sido forçados a desempenhar papéis baseados na sociedade heterossexual, butch e femme, “casamentos” nucleares que continuam dentro do relacionamento a mesma opressão que a sociedade exterior força nas suas mulheres. (Walter 1980: 59).
Um outro escreveu: ‘Desempenhar papéis em uma sociedade que demanda definições de gênero, interpretação de papéis sexuais, masculino versus feminino – o que nós podemos fazer, aqueles quem a sociedade rejeita e condena como metade-homens? Muito frequentemente nós reagimos representando exageradamente’ (p. 87).

Nos anos da libertação gay, nenhum argumento foi feito que interpretação de papéis fosse uma experiência ‘autêntica’ e exclusivamente lésbica ou gay, como aconteceu nos anos 80 e 90 (Davis e Kennedy 1991). Não existia vergonha em reconhecer que gays estavam envolvidos em mimetizar a sociedade hétero quando eles embarcaram em desempenhar papéis. Gays eram entendidos como construídos pelas regras da sociedade heterossexual também. Carl Wittman da Libertação Gay dos Estados Unidos declara:

Nós somos crianças da sociedade heterossexual. Nós ainda pensamos hétero; isso é parte da nossa opressão. Um dos piores de todos os conceitos héteros é a desigualdade... homem/mulher, em cima/em baixo, casado/não casado, heterossexual/homossexual, chefe/trabalhador, branco/negro, e rico/pobre....Por muito tempo nós mimetizemos estes papéis para nos proteger – um mecanismo de sobrevivência. Agora nós estamos nos tornando livres o suficiente para largar os papéis que selecionamos provenientes de instituições que tem nos aprisionado. (Wittman 1992: 333)

Um grupo de mulheres que formou parte da libertação gay nos EUA, o Partido Gay Revolucionário da Convenção de Mulheres, rejeitou firmemente a idéia de papéis sexuais para lésbicas, por isto não conter vantagens para elas.

Apesar de nenhuma de nós jamais ter sido educada em conduta de relações de igualdade sem papéis, lesbianas podem chegar mais perto desta realização que outros, porque nenhuma das instruções sexistas de representações de papéis que todo o mundo recebe ajuda a fazer seus relacionamentos funcionarem. Desempenhar papéis as leva para lugar nenhum, pois a “butch” não recebe nenhuma das recompensas sex uais, sociais e econômicas do macho enquanto a “fem” não tem um homem que traga para casa o salário de um homem ou para protegê-la do ataque de outros homens. (Gay Revolutionary Party Women’s Caucus 1992: 180)

Tais sentimentos, proveniente daqueles que teriam visto a si mesmos na época como a vanguarda da política gay, encontram-se em contraste total com a postura a respeito da interpretação de papéis lésbica que se desenvolveu mais tarde em algumas áreas da comunidade lesbiana. No fim dos anos 80 e anos 90 escritoras lésbicas tal como Joan Nestle (1987) construíram elas mesmas consideráveis reputações celebrando e romantizando representações de papéis como a mais autêntica forma de lesbianismo. Considerando que na libertação gay a resposta para os papéis era ‘largar’ eles, nas décadas posteriores eles foram selecionados, polidos e redispostos para o propósito de excitação sexual (Munt 1998; Hallberstam 1998a; Newman 1995).

Uma outra corrente comum entre a libertação gay e a libertação das mulheres naquela época foi a recusa ao casamento e a família nuclear. Casamento era considerado por ambos a ser um contrato de exploraç ão e dominância masculina, que necessita precisamente de ‘papéis sexuais’ que eram vistos como tão opressivos. Tão fundamental era a oposição ao casamento que ela foi enfatizada por Jill Tweedie, uma influente colunista do Guardian, em um fragmento positivo a respeito da libertação gay: ‘Libertação Gay não demanda pelo direito de homossexuais de casar. Libertação Gay questiona o casamento’ (citado por Power 1995: 64).

Dois aspectos da teorização da libertação gay a distinguem dramaticamente das políticas queer. Um é a compreensão que a opressão de homens gays origina-se da opressão das mulheres. O outro é que muitas formas de comportamento gay masculino, que hoje são elogiadas nas políticas queer, são o resultado da opressão gay, e não pode ser destruída sem aniquilar a opressão das mulheres. Formas de comportamento que historicamente foram parte do comportamento de homens que fizeram sexo com homens, como caçada e efeminação, foram vistas por ativistas da GLF (Frente de Libertação Gay) como resultado da opressão, mais propriamente que inevitáveis ou formas autênticas de comportamento gay.

A excitação política original da libertação gay durou apenas poucos anos no Reino Unido e nos EUA. No Reino Unido alguns homens voltaram para práticas que eles tinham criticado quando a libertação gay estava em seu auge, tal como caçada (Shiers 1980). Agora que uma notória comunidade gay subsistiu como um mercado, novas atividades comerciais gays tornaram-se envolvidas na ex ploração de homens gays do mesmo modo que heterossexuais e negócios da máfia tinh am feito em tempos anteriores: nasceu o capitalismo gay. Masculinidade gay tornou-se a moda, cons iderando que a política da libertação gay tinha evitado a masculinidade como o comportamento da dominância masculina (Humphries 1985). Uma política de ativismo gay de direitos iguais começou a desenvolver-se, o que alguns liberacionistas gays viam como desradicalizando e minando o movimento por mudança social radical. Por que, então, a objeção radical da libertação gay não foi sustentada?"


trecho do livro Unpacking Queer Politics, de Sheila Jeffreys (2003).

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Preferência versus Orientação


Heather L. Moore

“As palavras e frases novas são uma medida orgânica de mudança. Capturam as transformações da percepção e muitas vezes da própria realidade”Esta frase foi escrita por Gloria Steinheim em 1982, num ensaio entitulado “Palavras e Mudança”. No seu ensaio, ela explica os modos como as feministas mudaram o nosso mundo através da linguagem, e a importância que a linguagem continua a ter na redefinição daquilo que somos como mulheres e no modo como somos compreendidas e tratadas. Uma frase que atualmente é comum nos meios de comunicação e entre os grupos de direitos das Lésbicas e Gays é orientação sexual. É usada em leis gerais e municipais feitas para acabar com a discriminação, e em ensaios de estudiosos que examinam diversos aspectos da homossexualidade. Em toda a nossa sociedade, “orientação sexual” foi codificado como o termo a usar quando se discutem questões envolvendo homossexuais. Ocasionalmente, ouvimos usar o termo preferência sexual em debates retóricos sobre questões das Lésbicas e Gays - mas isso é frequentemente um sinal que o orador é ostensivamente anti-homossexual. Então que diferença faz qual a frase que se usa? A terminologia serve o seu propósito se sabemos, apenas através da terminologia escolhida, quem apoia ou não os direitos das Lésbicas e Gays. Não é? Mas a linguagem não ajuda apenas a etiquetar a realidade - também ajuda a criá-la. Citando novamente Steinheim “Nesta vaga [a segunda vaga do feminismo] as palavras e a consciencialização lideraram o processo de modo a que a realidade se lhes seguisse”. As palavras que usamos para descrever questões feministas tem uma enorme importância. Precisamos dizer aquilo que pretendemos, não o que é mais conveniente ou simples. Como feministas, o nosso uso da linguagem tem sido, e continua a ser, uma das nossas armas mais poderosas na luta para atingir a igualdade.

Todavia, esta questão é complicada pelo fato de muitas Lésbicas e Gays usarem o termo “orientação sexual” para se descreverem. Muitas vezes usam este termo sabendo perfeitamente o seu significado e que implica determinados pontos de vista em relação à sexualidade humana. Por exemplo, no número de Março de 1993 da revista The Atlantic, Charles Burr escreve àcerca das novas evidências que ajudam a “provar” que a homossexualidade tem uma origem biológica. Ele escreve “Cinco décadas de evidências psiquiátricas demonstram que a homossexualidade é imutável e não patológica e um grande número de novas evidências implicam a biologia no desenvolvimento da orientação sexual”. No princípio do artigo, Burr afirma que “o termo orientação sexual, que nos anos 80 substituiu preferência sexual, põe em evidência a natureza profundamente enraizada do desejo sexual e do amor. Ele envolve nele a biologia.” Isto faz levantar questões importantes - queremos realmente envolver a biologia? Será que as feministas acreditam que a biologia é responsável pelas nossas vidas sexuais? Na verdade as feministas não falam numa voz singular; mas alguns conceitos têm um maior grau de credibilidade feminista que outros.

O debate sobre preferência versus orientação é importante para as feministas porque lida com a maneira como caracterizamos o que é “naturalmente” masculino e feminino. Ou seja, para uma pessoa sentir atração por uma categoria particular de pessoas, essa categoria deve ter definições e limites específicos. As características femininas ajudam a descrever e a definir as mulheres; se uma pessoa é inerentemente atraída por mulheres é num certo sentido inerentemente atraída pela feminilidade. Todavia, a maioria das características a que chamamos femininas foram definidas pela sociedade como tais - como é do conhecimento geral, “feminilidade” não é um termo baseado em fatos científicos ou biológicos. Como feministas, sabemos como pode ser problemático definir o que é “feminilidade” ou “masculinidade”; por isso, necessitamos ser muito cautelosas ao nos referirmos à sexualidade em termos biológicos. Afinal se nós como feministas consideramos que o gênero é uma construção social, como poderemos considerar que a atração por um determinado gênero é fundamentalmente biológica? Mais uma vez, a linguagem que usamos para nos descrever e para descrever as nossas preocupações tem uma importância crítica. Se estamos a usar linguagem que (como foi apontado por Burr) implica a biologia, deveremos sentir realmente que a biologia é responsável pelo nosso comportamento sexual. Esta crença não está limitada às discussões sobre a homossexualidade relacionando-se também com o tópico da sexualidade em geral. As feministas que apoiam os direitos as Lésbicas e dos Gays necessitam de examinar de um modo crítico os seus pontos de vista em relação à sexualidade. Como Ruth Hubbard, uma bióloga feminista da Universidade de Harvard, aponta no livro Exploring the Gene Myth (Explorando o Mito dos Genes) “ Todos nós temos uma grande variedade de sentimentos eróticos. As sociedades definem alguns como sendo sexuais e regulam o grau e os modos em que nos é permitido desenvolvê-los e exprimi-los...

A sexualidade humana é complexa e é afetada por muitos fatores. A incapacidade de arranjar uma explicação clara [para a homossexualidade] envolvendo o meio ambiente não é surpreendente e não conduz à conclusão que a resposta pode ser dada pela biologia”. Se acreditamos que a biologia não é de fato a influência determinante nas nossas vidas sexuais, então deveremos usar uma linguagem que esteja de acordo com este ponto de vista. Atualmente os meios de comunicação de grande divulgação e alternativos apresentam às suas audiências duas posições no debate sobre as origens da homossexualidade: ou apoiamos os direitos das Lésbicas e Gays e aceitamos a ideia que a homossexualidade é determinada biologicamente (a posição “ninguém escolheria ser homossexual”); ou opomo-nos aos direitos das Lésbicas e Gays e acreditamos que os homossexuais escolhem ter um comportamento de “desvio sexual”. O que está a faltar neste edifício de retórica é uma voz feminista forte. Como feministas deveremos admitir o largo intervalo de escolhas sexuais que temos, deixando saber aos outros que essas escolhas deverão ser respeitadas e encorajadas. Ou seja, o conceito de escolha sexual simultaneamente real e vantajoso deverá ser difundido em discussões com heterossexuais e homossexuais.

Todavia, considerando o amor que os Americanos tem para dar respostas simples a questões complexas, é fácil compreender os raciocínios usados para a descrição da sexualidade em termos biológicos. Este enquadramento das origens da homossexualidade torna mais fácil lidar com os nossos aliados heterossexuais da Esquerda. Dizer que a sexualidade é imutável torna mais fácil aos heterossexuais liberais e compadecidos lidar com a questão da homossexualidade. É menos intimidativo e menos complicado, porque dizer que uma pessoa escolhe ser homossexual é dizer simultaneamente que não se escolhe ser heterossexual. E alguns heterossexuais ficam incomodados ao ouvirem as suas opções de vida serem rejeitadas. No entanto, os heterossexuais não terão que se sentir criticados ou julgados sobre a sua vida sexual, se puderem defender que a homossexualidade é resultado de algum fator biológico que não pode ser controlado. Aos homossexuais também lhes agrada esse conceito de “origem biológica” porque reduz o conflito entre homossexuais e heterossexuais ao explorar das semelhanças existentes na vida das pessoas, em vez de fazer uma análise crítica das diferenças vividas pelos homossexuais e heterossexuais. As Lésbicas e os Gays tem que lidar frequentemente com sentimentos de alienação e isolamento culturais; portanto quando lhes é dada uma oportunidade de construir um sentimento de aproximação, existe um desejo de a apadrinhar. Por outras palavras, usar a biologia como explicação para a sexualidade ajuda a despolitizar o controverso debate sobre a homossexualidade.

Alguns ativistas dos direitos das Lésbicas e dos Gays também acreditam que terão mais sucesso na luta contra a discriminação nos tribunais e nas legislaturas se puderem “provar” que a homossexualidade é uma característica biológica. O Supremo Tribunal [dos EUA] teve que lidar no passado com casos de discriminação contra grupos minoritários “imutáveis”. Portanto as Lésbicas e Gays envolvidos em estratégias políticas acreditam que ao adotar o termo “orientação” e a filosofia que é o seu corolário (quer pessoalmente acreditem nela ou não) irão obter a curto prazo alguns benefícios políticos. Todavia, como nos lembra Hubbard, “Ter conhecimentos básicos das diferenças em biologia não acaba com os preconceitos. Pelo contrário, os Africanos-americanos, Judeus, pessoas com deficiências físicas e também os homossexuais foram perseguidos por “deficiências” biológicas, tendo havido mesmo tentativas de exterminação para evitar a “contaminação” biológica. E as mulheres também têm lutado pela equidade como grupo imutável e ainda estamos longe dessa igualdade. A vantagem política que supostamente ganhamos ao usar o termo “orientação” é no mínimo questionável.


(Traduzido do nº de Junho de 1994 da Revista Off Our Backs por S. Marinho)

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

O amor ao próprio Reflexo

Antes que existira ou pudesse existir qualquer classe de movimento feminista, existiam as lesbianas, mulheres que amavam a outras mulheres, que recusavam cumprir com o comportamento esperado delas, que recusavam definirem-se em relação aos homens, aquelas mulheres, nossas antepassadas, milenares, cujos nomes não conhecemos, foram torturadas e queimadas como bruxas.

- Adrienne Rich.

Tudo está processando-se na historia e está esse velho tema do amor,

o par e os limites

Nós mulheres temos sustentado largas lutas externas e internas com nossas capacidades, de querer ser atuantes de nossos desejos, de nos entendermos mulher e entender-nos mulheres em coletivo; nossos diálogos internos, fundamentalmente, têm sido de feminilidade à feminilidade, ou seja de construção patriarcal a construção patriarcal deste dever de ser nosso corpo mulher.

O diálogo mulher/mulher é mesmo um pendente, pois o diálogo que existe, o que se tem memória, é o que fez na história, é o feminino-feminina. Neste diálogo se prima a alheidade da mulher, é um diálogo "do outro", é o condicionamento ao amor patriarcal, nunca o amor entre mulheres como conjunto pensante, pois mesmo dentro da construção do amatório temos sido apartadas. Temos tido que nos declarar inteligentemente meio tontas para existir e permanecer no prado marcado e sinalizado da feminilidade e, isto tem mais transcendência do que à primeira vista aparece como uma briga por sobrevivência, sobrevivência que é a custa de nossa dimensão humana, pensante e atuante, é as custas deste diálogo mulher/mulher.

Enquanto não sejamos capazes de interrrogar o desenho do modelo que "tiveram feito outros da nossa erótica", de nossas formas de erotizar-nos, enquanto não sejamos capazes de aceitar e criar outros modelos, de abrir a atração entre mulheres, abrir a necessidade de entrar em diálogos corporais e erotizados com uma outra Igual, não nos amaremos a nós mesmas, não nos amaremos como mulheres e, fundamentalmente, não nos respeitaremos como gênero. Quando nos interrogamos, recém començamos a meter-nos no mundo, recém começamos a romper a própria misoginia - consigo mesma e com as demais - ; antes é um estar como de convocada, convidada a um sistema que é pensado através de nós mesmas, que se erotiza com nossos corpos, não conosco, senão com essa estranheza sobre nosso corpo mulher com que nos foi significado, sempre um pouco fora, fora do mundo, fora da cultura, fora da política e fora de nosso próprio corpo.

Preocupam-me essas mulheres que se declaram profundamente heterosexuais, que divinizam o corpo masculino, mesmo que seja este mesmo corpo que adoram aquele que as teve submetido à secundaridade como espécie, aquele que as menospreza.


Esta outra memória velada de nós mesmas, que existe, que é parte de nossa história, é toda uma cultura subsumida
na "feminilidade". Existe uma atração entre mulheres, justamente por toda esta alheidade a que temos sido submetidas, um desejo que poderíamos associar à paixão mais que ao amor, à solidariedade ou à amizade entre mulheres, este desejo de aprender /aprender-nos, de conhecer/nos, de descobrir/nos. Neste lugar da paixão, quem sabe, seja possível entender/nos e entender às coisas que nos passam entre mulheres. Desde a feminilidade construída é muito difícil entender essa paixão entre mulheres, pois que a memória está borrada e não se deixa circular, porque indiscutivelmente o sistema instala a feminilidade misógina, que propõe o ódio à nós mesmas, o menosprezo, mesmo que algumas vezes nos erotizemos este espaço tão significado. Por isso quando nos erotizamos neste espaço tão pré-significado da feminilidade, ficamos estacionadas, não trocamos nada além de "o corpo da erótica".

A dimensão da paixão e sua memória dentro de nós existe, temos que encontrar/la e significar/la no tempo, há que se registrá-la e fazê-la sair do lugar do nada, já que o patriarcado tem uma preocupação especial de borrá-la, eliminando-a inclusive da memória de nossos próprios corpos porque ali radica sua vigência, ali constitui seu poder. É nossa responsabilidade, nosso desafio, entender e construir esta dimensão do desejo/paixão/de conhecer/nos.

Poderia afirmar que toda mulher conserva essa outra memória/imemoriada, que sua forma de relacionar-se com outra mulher está transpassada por esse conteúdo. Nada poderia propôr-se desde o feminismo e, em especial, desde o feminismo radical, se não passasse por recuperar "esta outra história" de mulheres.

Em todo ser humano existe a potencialidade de atravessar os limites culturais estabelecidos da heterosexualidade, somente se aceita essa potencialidade poderá este desfazer-se dos prejuízos contra as lesbianas e homossexuais e, me atreveria afirmar, que para além de romper com os prejuízos, assumindo esta potencialidade não estática da erótica, poderá começar a recém limpar-se da misoginia do sistema e este não é o mesmo exercício que executam os homens nem os homens heterosexuais, pois eles sempre tiveram amado a si mesmos e amado misoginistamente, estejam onde estiverem.

A amiga íntima e nossos pequenos incidentes lésbicos

As mulheres temos sempre uma amiga íntima, uma outra que nos contém, uma aliada e é com esta outra que se cruzam nossos pequenos incidentes lésbicos, imediatamente negados. Esta negação se enraiza na sensação de terror de descobrir-se pensando ou sentindo passar o limite do permitido na formação dos modelos de erótica e da ética/moral estabelecida. Paraliza-se ante a sanção iminente do sistema, se nega a si mesma, para não ser negada duas vezes pelo patriarcado: uma por ser mulher e a segunda por ser lesbiana. Outras não tantas se recusam a cumprir com o comportamento esperado, são as minorias rebeldes que nos fazem valentes, são as que transitam e assumem o lesbianismo e aquelas que se abrem a compreendê-lo de verdade.

Uma grande parte dos problemas que temos para fazer amizade entre mulheres passa por essa paixão/desejo de conhecer/nos, esta paixão não reconhecida, não historiada, não aceita mesmo nos níveis mais profundos de nossa consciência. A paixão/desejo, ao ser negada e constantemente postergada,se traduz em rechaços, traições e ódios tremendos fora da razão e do tempo, pois que 'a outra' a deflagradora desta paixão/desejo sancionada, é a idéia da Eva tentadora do mal, a que faz cair o homem, e que esta vez funciona para nós mulheres, em vez da nossa Eva. É, pois, difícil construir uma amizade, que não esteja prejudicada e permeada por esta proibição misógina de nos amarmos. Que memórias não recordadas trazem, que histórias de sensações de ardores e perdições de nós mesmas traímos por querer-nos, que mandatos a fim de odiarmos, sem sequer entender o que se passa?

Lesbianismo/parelhismo/espelhismo

Como nos querer de outra maneira diferentemente dos papéis, das inseguranças, das demandas de propriedade/fidelidade, sem o drama, o tango, sem o bolero, sem o segredo, sem deslealdades, sem nos atraiçoar-nos constantemente? É nesse espaço amoroso de mulheres de onde podemos reinventar outras formas e amor, este 'outro amor', essa suspeita de 'outra cultura', onde nos sejamos mulheres pensantes e não inventadas por outros, onde re-desenhar outras formas de convivências entre seres humanos/as que não seja a parelha do domínio.
Posto que o amatório é masculinista, 'a construção da parelha está patriarcalizada no domínio", e o patriarcado está em temperado con esta construção convencional do amor parceril. Arma essa escassez de amor em um discurso do amor grande, único, de 'a dois', em casal e para sempre, que ao final mata os amores, a uns por culpa e a outros de tanto amor; instala a dor, não o amor. É como a navalha de Robin Hood, porque Robin Hood empunha a navalha do amor, do bom amor, do amor salvador que pouco a pouco se vai confundindo com a navalha de Jack o Estripador, e uma morre sempre de algum destas duas punhaladas, padecem o mesmo, matam o mesmo.
A estética, a beleza do amor patriarcal estão simbolizadas na escrava/dominada, a mais bela de todas: a dominada. A que não ocupará o assento da rainha, a depositária do desejo que não é a metáfora da rainha, pois que a rainha é a mãe dos filhos, a continuadora da linhagem, a segunda (sempre) depois do rei, a guardiã de seus interesses, a custodiadora de seu poder e dos valores que o sustentam. Isto segue vigente, mesmo que pintem às rainhas e às escravas de todas as cores, de todas as modernidades.
A estética e a ética de lesbos é pelo contrário a
horizontalidade, porque nessa horizontalidade que se sucedem os intercâmbios pessoa-pessoa. Esse espaço amoroso devemos desenhá-lo, inventá-lo, temos que narrá-lo para que vá construindo um saber-amar-outro, para que vá acumulando-nos em sociedade de outra maneira, com outra ética e outra estética. Devemos ter cuidado de não readequar a parelha, acreditando que inventamos outro modelo, isso não seria mais que um reacômodo ao mesmo fango patriarcal. A cultura vigente nos faz sentir que somos diferentes, que nossas construções de casal/par são diferentes, ao mesmo tempo que nos submerge a todas em seus costumes e seus valores, fazendo que todos, de uma ou outra maneira, repitam os mesmos modelos.

Reinventar outro tipo de relação/amor leva ao feito de repensar a nós mesmas, repensar nossas formas de relacionar-nos, repensar as estratégias parceris e isto tem uma regra -se é que podemos falar de regras- e é saber não enganar a nós mesmas, e quando falo de enganar, não falo de infidelidades nem fidelidades senão de não disfarçar nada, de não esconder nada, nem proteger-nos, nem proteger a outros; isso tem uma dose grande de valentia, de riscos, de assumir-se sem proteções próprias nem alheias; tem a uma desbravadora, uma aventureira dentro e nada é intocavel, nada é inquestionavel, nada é sagrado; tem um objetivo claro e profundo de fazer-te expressada, livre e mais humana... e isto não deve ser confundido com fazer-se mais boa, porque geralmente é todo o contrário, pois que o "bonismo" amortece, esconde tudo, nega tudo; se arma desde o sacrifício e a hipocrisia... À estas alturas do conto, muitas já sabemos o difícil e doloroso que é... no contar finalmente o conto... quando tem-se mais outro conto.
Se não reestruturamos, re-alimentamos, re-desenhamos, re-humanizamos e repensamos o espaço lésbico, caímos de cara na exaltação patriarcal do romántico amoroso sentimental onde acreditamos estar livres da traição dos homens, exaltando a feminilidade-feminilidade: o amor sem limites dentro da irracionalidade; o amor sentimental, sacrificado, inquestionavel, sagrado; o amor em si mesmo como contido de honestidade, de interesses comuns; este amor que não se pensa, como se não tivesse uma pessoa responsável por detrás com seus valores, sua cultura, suas proposições, sua própria biografia e é, precisamente aqui, de onde o patriarcado tende a trapacear, pois não é o feitio de romper o limite da erótica estabelecida, a transgressão, senão o pensar dita transgressão, desenhar estratégias para que tal transgressão não seja como todas, recuperada.

Se não nos detivermos a repensar o casal[o par], que é a base do clã familiar patriarcal de onde se aprende o poder sobre as pessoas, estaremos repetindo o modelo, ou seja, buscaremos casar-nos, legitimar-nos perante o sistema, ter filhos, e se não tivermos filhos suprir a carência com gatos ou cães que serão cuidados como se fossem filhos; no fim, a cadeia não se detém em estabelecer as imitações da família, a família de mentira que é pior que a família da consanguinidade, e não estou dizendo que não há que se querer as crianças ou aos animais, senão não usá-los como suplentes, nem confundí-los como tão facilmente fazemos, de tratar às crianças como animais e aos animais como crianças.
O casal existe porque existe a lógica do domínio e o jogo do par é o jogo do domínio patriarcal; daí o tópico: "No amor e na guerra tudo se vale": ter serviço secreto, ter cativos, reféns, estratégias, assaltos, traições, planificação de ataque, imolações, derrotas, vitórias, etc. Essas manobras na guerra se disfarçam atrás do halo heróico salvador, o mesmo que no amor; contudo, no plano amoroso todas essas manobras são pintadas de novela rosa.
Esta cultura não entende nem constrói seres completos e em si mesmos, livres e autônomos, pelo contrário, os faz carentes de tal maneira a ter que completarem-se em outro/outra, dependendo sempre de outro/outra e isto ademais o constrói socialmente. Uma pessoa sem necessidade de completar-se em um outro/outra, com projetos e desejos independentes está em desvantagem ante o sistema, ao mesmo tempo
que está en completa vantagem sobre si mesma, está com o poder de desenhar sua vida, está na libertade. Porém, o sistema que está armado para o casal, sanciona essa liberdade de desenho da própria vida, os vê quase tenebrosos, pois o sistema está pensado para dois e, ademais, está pensado para a parelha reprodutiva, não para indivíduos, nem para sujeitas/os que se vão modificando no tempo com a vida, senão para sujeitos estáticos e conservados de a dois. Muito distinto é falar da liberdade de estar, amar e transitar acompanhado com um outro/outra, que estacionar-se em uma parceria patriarcalizada com a projeção de 'pela vida', repetindo o modelo de propriedade.
O sistema arma a parelha (matrimônio) de tal maneira que: um tem o poder e o outro o contrapoder (papeis que se invertem, que nem sempre são estáticos). Cativa às pessoas com o mandato da segurança que proporciona a fidelidade, com a proposta e o anseio por eternidade, com a qual esta construção baseada no amor, termina por encerrar o amor e matá-lo.
Devemos entender que com essa construção do amor não armamos às mulheres vez que somos nós as mais capturadas nelas, nos instala como as próprias guardiãs da feminilidade, havendo que prestar contas, a ter que explicar-se e justificar-se: por que olhou, por que não chegou, por que pensou, por que te foi, por que voltou, por que sonhou, por que gritou, por que se rebelou. Os outros modos, os outros ensaios de convivências são invisibilizados e castigados pelo sistema, pois o sistema está vigiado (Foucault).


Como lesbianas, temos uma história gestual de vida que vai mais além do relato amoroso vigente. Por ela, submergir-se em uma parelha já significada, tem muitos custos, custos de vidas inteiras, do mesmo modo que sair-se das atuais formas de amar con suas fidelidades e lealdades também tem custos de vidas inteiras, não sabemos fazê-lo, não há modelos, não há registro - apesar de haver muitos ensaios silenciados-, não temos idéia de como fazê-lo; com tantas inseguranças, carências e medos com que nos socializam, sofremos muito, porque somente estando submergidas no drama nos sentimos viver e morrer ao mesmo tempo. O drama captura, impede qualquer reflexão que não passe pelos estados obssesivos da dor, poi a cultura vigente está embasada no dor-sofrimento.
Não temos re-simbolizado a vida e menos o amor como para vivê-lo de outra maneira, não temos desentranhado as projeções de propriedade sobre outra pessoa e para que exista uma outra/o como propriedade, pois deve existir uma proprietária/o, uma depositária de nosso sacrifício de entregarmo-nos, e insisto em que o sacrifício é uma armadilha e até que não descubramos o arriscado que é este sistema sofredor, seguiremos permeadas do sacrifício de uns por outros... e não estaremos saindo de toda a hipocrisia antagônica do sistema... Não quero que ninguém se sacrifique por mim nem quero sacrificar-me por ninguém,
não creio em mártires, nem em cruzes para construir o respeito do humano. Recriando parelhas sacrificadas não se constrói o respeito e isto é um gesto profundamente político.


É necessário romper nossas necessidades tão profundamente inscritas com argumentos culturais biologicistas de complementaridade, já que estes têm levado a entender o amor somente em sua dimensão reprodutora, protetora e cuidadora do casal heterosexual, tão funcional a um sistema capitalista e neoliberal.


A parelha lésbica que deverá romper profundamente esta construção cultural, se enreda muito mais que a parelha heterosexual, tão instalada e legitimada: por um lado, se mantém em um meio totalmente hostil que faz com que se unam, se protejam, se encerrem a uma na outra como uma condição de sobrevivência e proteção ante o meio. Por outro lado, ao sairmos deste amor reprodutivo e de domínio, tomamos o discurso do romântico amoroso sentimental. O homem que é infiel por natureza, já não está, não é requerido, nem essencial no jogo amoroso, no entanto, se nos juntamos duas mulheres que somos "a fiéis por natureza", as que "sim sabem amar", "as que amamos sem limites", traduzimos essas fidelidades em clausuras, depositamos-lhe a clausura ao sistema, nos sistematizamos, "nos ordenamos" em par, nos perdemos como pessoas individuais, nos simbiotizamos com a outra em um gesto siamésico, deixando todas as alternativas de libertade, de amor, de vida, de eros, enclausuradas, pois o casal é uma construção cultural criada pelos homens em prol de suas seguranças e acomodações socias; é a
redução minimizada do poder, por ela está sempre em crises e, embora nos empenhemos em esconder dita crise, cada certo tempo voltará a aparecer no horizonte, alucinada com outros eros, outros despertares corporais, outros desejos de libertade.
A parelha já significada faz a gente perder não somente o amor, senão o desejo de aventura, de aventurar-se em outros seres, de aventurar-se a inventar novas sociedades, novas culturas, novas formas de relacionar-se. Faz desaparecer aquele anelo da comprensão, e é justo ali onde aparecem os seres podres por dentro e por fora, toda essa quantidade de seres humanos que não estão vigentes, pois depositaram em outro/a toda sua capacidade erótica, amorosa e criativa, e sem esse outro/outra se trasformam em seres amputados e isto que parecera que pertencia ao mundo do amor, ao mundo privado, é do mundo concreto, da vida cotidiana que construimos como sociedade.
A quem estamos entregando o poder sobre nós? Quanto tempo na história respondemos à família, a que julga, mal/ama e finalmente nos instala em uma sociedade a sua imagem e semelhança? Como poder viver nossos amores e desamores, de tal maneira que sejam
uma proposta de respeito humano e liberdade mais além das proteções e dos sacrifícios dos moldes de propriedade e fidelidade patriarcal?
O dia que tenhamos uma linguagem de narração própria da sexualidade das mulheres, próprio da sexualidade lésbica - não a linguagem da negação que temos tido até agora, não a linguagem da sexualidade legitimada e profissionalizada, hoje tão na moda, resguardada constantemente em sacralidades- poderemos limpar este espaço e lograr que seja diferente.
O amor não é apenas um único na vida, não nasce de gerações espontâneas, existe um fiar de amores, como de colares, que se vão engarçando no tempo. Cada um tem um sentido, cada um traz uma proposta, em cada um vai ficando um pendente, e todos estes pendentes, acumulados, reservados no tempo são os que aparecem reais e concretos no presente amor e este do presente vai a constituir, por sua vez, até o futuro outro pendente... O amor não é um único, nem morre em um acidente na esquina, é um constante de nossas vidas, aparece como aparecem os seres humanos -diferentes-, nos provocam novos desafios de entender-nos, novos desafios de redesenhar-nos e sanar-nos do "maltrato cultural",
de entender que há várias maneiras de entender o compromisso por outra pessoa, o sentir amor enquanto dure o sentimento, e este compromisso só pode ser o cuidar o mais que se possa deste sentimento, que uma vez que começa, também começa a desaparecer; como tudo na vida, tem um início, um tempo e um fim.

Se os sonhos, os amores e as liberdades que não se vivem, se morrem por dentro... te apodrecem, te matam pouco a pouco. Olha como está este mundo sem sonhos, sem amores, sem liberdades, morrendo.

Somos Nós mesmas as que temos que...


Repensar nossas formas amorosas de nos relacionarmos, repensar nossas formas políticas de nos relacionarmos, religá-las, pois são políticas. Se como lesbianas queremos instalar-nos na parelha patriarcal, não estaremos mudando nada mais que o corpo de nosso desejo erótico; mudamos o corpo masculino pelo feminino, mas com a mesma cenografia para montar o mesmo conto, não estamos propondo nenhuma mudança além do desejo de legitimação como grupo minoritário. Ao mesmo sistema que nos deslegitima o suplicamos que nos legitime, fazendo-o duplamente poderoso. E quando falamos de sistema estamos falando desde o núcleo familiar até as instituições, todos constituídos por seres de carne e osso. É aí que perdemos o rumo, pois não pode existir uma modificação do sistema através de nós mesmas, senão um acomodamento de nós ao sistema, por isso me surpreendo de ver que existam lesbianas que queiram casar-se ou que desejem ser parte do exército... mais para além do direito de igualdade e as vocações de cada uma, creio que há que repensar a vigência do matrimônio, pois é uma instituição tão patriarcal como os exércitos. Temos que separar águas com quem quiser dar continuidade a um sistema injusto, arbitrário, racista, baseado na propiedade privada e na primazia do homem branco.
Um movimento lésbico-político-civilizatório, repensa todos os elementos que tramam o sistema e deste lugar desenha suas estratégias políticas. Não pode entregar sua reflexão a outros grupos marginalizados, pois a única coisa que as une a outros grupos marginalizados é somente o feito da marginalização. Não temos os mesmos interesses políticos que os ecologistas, que os gays, os travestis - que são os que têm retomado e reinstalado o discurso da feminilidade- nem com os diferentes projetos dos partidos políticos, nem das igrejas, etc.


Sem pensar/nos e re/pensar o movimento lésbico político civilizatório, não poderemos desarticular o sistema, pois sem este reanalizar-nos, não saberemos se não é desde dentro do próprio movimento lésbico que estamos traindo nossas políticas e nossas potencialidades civilizatórias.
A análise da realidade desde a cultura vigente e suas propostas, é
uma realidade que não existe para nós, é uma realidade onde nunca estivemos, nem estaremos, nem estamos, nem nos pertence como análise, por isso devemos revisar muito cuidadosamente a necessidade de aderirmos a qualquer análise ou proposta de mudança que não provenha de nós mesmas, recuperar nossas próprias reflexões, nossa própria história política, pois obviamente não temos os mesmos interesses de outros grupos marginalizados; podemos fazer alianças circunstanciais, mas não deixar que nosso discurso seja tomado por outros, que se perca em outros.
Sentindo-nos 'tão fora do sistema' nos baixam nostalgias de legitimidade, e essas nostalgias nos fazem perder-nos e traem nossa história, terminamos por querer estar no centro mesmo do poder, quando o desafio político é não formar parte do sistema, não colaborar com o mesmo sistema que há poucos anos nos queimava nas praça públicas e que de outra maneira, menos visível, nos segue queimando, nos segue perseguindo, nos segue reciclando.

Há um limite ético e político com nós mesmas e nosso corpo; por isso, deixar as coisas como estão, já não é possível, não existe essa realidade para nós.

Margarita Pisano 16 de outubro de 1997

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

PORNOGRAFIA GAY MASCULINA - UMA MATÉRIA DE SEXISMO

Discurso apresentado em "Discurso, igualdade e dano", na Universidade de Direito de Chicago, Março 1993

O gay mediano me confunde. Como um homem gay ele vive com o medo e a realidade do taco de baseball e do pé-de-cabra. Ele conhece ódio e o que significa ser vítima de violência. Então porque a resposta de homens gays à Butler, o mais recente, e bem sucedido, esforço da Suprema Corte do Canada dirigido aos danos da pornografia? No Canada, quando a decisão Butler foi lançada, homens gays expressaram revolta. Como um homem gay branco, essa reação me deixa confuso e, infelizmente, à procura desesperada de uma comunidade. Por eu considero pornografia gay masculina uma matéria de poder, uma fonte de inequalidade social -- incluindo a minha.
Alguns vêem pornografia gay masculina como uma parte integral para a formação da identidade gay masculina, como algo que desafia heterossexualidade como uma construção social compulsória. Para a minha mente, pornografia gay masculina não é nenhum dos dois. É discurso de ódio. É integral, de fato central, para a formação de uma identidade gay masculina misógina e heterossexuadamente definida. Pornografia gay masculina não desafia heterossexualidade e dominância masculina. Ela apoia isso. Quando eu a vejo, distribuida em massa por aqueles que professam apoio por uma agenda de direitos gays comprometida com igualdade, eu vejo o umbigo das políticas de identidade atuais -- uma identidade gay que rejeita compaixão, afeição, e cuidado entre dois homens, e que ao invés promove homofobia internalizada, ódio, e o dano à outros. Pornografia gay masculina apresenta hiper-masculinidade, o que significa ser um homem socialmente construido. Essas imagens garantem que dominância masculina branca será mantida e que aqueles que historicamente foram negados igualdade continuarão a ser vítimas de ódio e violência.

Deixe me enfatizar que estou falando sobre pornografia gay masculina, não pornografia lésbica. Enquanto tenho poucas dúvidas que muitos desses assuntos que levantei hoje igualmente se aplicam à pornografia lésbica, eu não pretendo tocar nisso hoje. Ao invés, falarei do que para mim é mais perto de casa.
No Canada, nós somos felizardos em ter uma Suprema Corte que, em 1992, quebrou precendente e no processo reafirmou compromisso com equalidade como um direito canadense central. O caso de R. v. Butler não representa a primeira vez que foi pedido a corte regular nos valores clamados e danos expressos da pornografia, mas é a primeira vez que a corte explicitamente passou leis contra materiais pornográficos porque sua distribuição e produção minam "respeito por todos os membros da sociedade, e não-violência e igualdade em suas relações entre si."
Em Butler, a corte reconheceu que pornografia iguala dano, argumentando que:

o perigo claro e inquestionável desse tipo de material é que reinforça algumas tendências não-saudáveis na sociedade canadense. O efeito deste tipo de material é reinforçar homem-mulher esteriótios no detrimento de ambos sexos. Tenta fazer degradação, humilhação, vitimização, e violência em relacionamentos humanos parecerem normais e aceitáveis. Uma sociedade que considera egualitarismo, não-violência, consensualismo, e mutualidade como básicos para qualquer reação humana, seja sexual ou outra, é claramente justificado em controlar qualquer meio de representação que viola estes princípios


Aplicando esta análise, a corte especificamente rejeitou casos de lei prévios em que foi tido que pornografia deveria ser regulada para que se mantenha padrões morais. Ao invés, reconheceu que nem todo discurso é igual e que algum discurso é, de fato, a própria fonte da inequalidade. A corte então forneceu um novo padrão judicial de avaliação de liberdade de discurso - um padrão que irá ajudar na luta em andamento por equalidade.
Canada é também o lar para Chris Berchell, uma escritora para o maior jornal lésbico e gay de Toronto, quem, após Butler, tinha o seguinte a dizer:

Organização pré-eminente canadense feminista de reforma de lei, a Legal Equality Action Fund (LEAF) parece determinada em cortar o direito recentemente enriquecido dos canadenses à liberdade de discurso antes que a maioria de nós tenha a chance de exercitá-lo... O fato que esperteza pública e expert acredita que pornografia causa danos é devido ao sucesso da campanha anti-pornografia das últimas décadas, carregada por uma dúbia aliança entre cristãos direitistas e tais feministas e anti-sexo crusaders como Andrea Dworkin e Catharine MacKinnon, que ajudaram a desenvolver a estratégia de LEAF no caso Butler. Milhares de dólares são enviados para grupos de mulheres que ativamente espalham esta informação errada... É um comentário triste sobre nosso tempo que uma pane moral sobre imaginário sexual é liderado por feministas; que suas estratégias são canalizadas em um backlash anti-sexo que atinge queers primeiro e mais forte!

Chris Berchell acredita que pornografia gay masculina não deveria ser "censurada". Seus argumentos são baseados na suposição que pornografia gay masculina não causa dano -- isto é, que ela não resulta em mudanças comportamentais e de atitude que adicionam à real dano físico e que mina equalidade social. Para minha mente, está análise é ambas politicamente ingênua e socialmente regressiva.
Para todo o esforço gasto em defender pornografia gay masculina, é em dizer que existe pouca descrição ou documentação do que pornografia gay é -- isto é, como ela se parece, o que ela faz, e o que ela diz. Se pornografia gay masculina fosse libertária, então uma analise de como é produzida, por quem, e uma descrição de quem e o que ela representa como fonte da libertação se provariam utéis. Infelizmente, advogados de pornografia gay masculina falharam em providenciar até informação básica sobre o que tão fortemente defendem. Focando mais em seu percebido efeito positivo, eles prentendem evitar qualquer análise realística de onde tal efeito surge. Isto, em retorno, tendeu a legitimizar esses argumentos que, tendo ignorado a realidade do que é promovido, resultou em ignorar seu dano.
Pouca pesquisa foi feita na area de pornografia gay masculina, mas parece ser uma indústria enormemente lucrativa, com a maioria de seus lucros indo diretamente para algumas das pessoas que produzem pornografia hetero. (Quanto para um distinto discurso gay, por nós e para nós!) Em 1985 somente haviam dez ou mais companhias produzindo aproximadamente cem fimes pornográficos por ano, cada um vendendo por aproximadamente quarenta dolares. Ninguém sabe ao certo quantos desses filmes são vendidos a cada ano, mas em 1895 apenas, William Higgins, o auto-intitulado "rei da indústria porno gay", lucrou mais de $2 milhões. Neste mesmo ano, revistas pornograficas gays, que vendem por sete para 15 dolares cada, tiveram uma distribuição de mais de 600.000 revistas por mês. Isto é mais de 7 milhões de revistas em um ano.

Pornografia gay masculina lança títulos como Nazi Torment, Slant Eyed Savages, Teen Bootlicker, Leather Rape Gang, Big Black Cocks, Stud Daddy, Oriental Guys, Inches, e Slaves of the S.S. Uma vez dentro, você recebe aberturas com nomes tipo "Be My Sushi Tonight," "Caught Sniffing First Playmate's Dad's Uniform," "More Prison Violations: Spick Muscle Enslaves Anglo Cellie," "I was a Substitute Vagina," e "I Slapped Him Until He Came."
O que um vê em pornografia gay masculina é quase uma glorificação pervasiva do icone masculino/homem idealizado. Policiais, caminhoneiros, cowboys, bicicletistas, e nazistas são erotizados. Esteriótipos raciais são sexualizados e perpetuados. Músculo, "boa pinta", e juventude são glorificadas. Ostentamente hetero ou ao menos "hetero-atuando" estupro de homens e/ou humilhação de descritivamente (frequentemente esteriotipados) homens gays. Sadismo, bondage, esportes aquáticos, fisting, lamber botas, piercing, estapear, chicotear, incesto, branding(*marcação*), queimando com cigarros, tortura de genitália e mamilos com cera quente, clips, e o tipo, estupro, e estupro presidiário são apresentados como eróticos, estimulantes, e prazerosos. Na maior parte destes materiais, é o branco, fisicamente mais poderoso, mais dominante macho quem é romantizado e oferecido um status de exemplar. Nestes cenários em que parceiros sexuais "trocam vez" sendo "topo", as caracteristicas de dominância e não-mutualidade permanecem centrais ao ato sexual. O resultado é hieráquico e raramente compassivo ou sexualmente mutuo.
Isto é pornografia gay masculina. Isto é o que advogados pró-porno estao defendendo. Isto é a sua política de identidade. Enquanto conteúdo e apresentação podem variar em graus e explicitação de um meio para outro, o que um nota acima é uma visão geral do que pornografia gay masculina é. Se nos levamos a sério, e se levamos a sério a questão de políticas de identidade, então devemos a nós mesmos examinar do que essa política consiste.

A política de identidade que um pode filtrar de pornografia gay masculina é uma de degradação, exploração, assertividade associada à agressão, força igualada à violência, poder fisico e o direito do supro-poder, intimidação, controle de outros, falta de mutualidade, e desrespeito. Se você defende pornografia masculina gay, você também defende estas qualidades como centrais à identidade gay masculina. Você defende comportamento agressivo, não-consensual como normal, até libertador e promovido como tal.
A questão a ser posta então é se a politica de homem gay que ela passa pode resultar em minha eventual libertação. Eu não acredito em tal. Ao invés, as políticas de identidade irão resultar em dano considerável -- precisamente os tipos de danos dirigidos em Butler, que foram rapidamente rejeitados como não-existentes na pornografia gay e comunidade gay em geral.
Dada a descrição acima, não é talvez uma surpresa que pornografia gay frequentemente coloca seus "modelos" em cenários que promovem violência, crueldade, degradação, desumanização, e exploração. Enquanto tidos como meramente representacionais, veja "ficcional", a "fantasia" oferecida em pornografia gay utiliza pessoas de verdade, um fator que a maioria dos advogados pró-porno ignoram. Os homens usados em pornografia gay masculina são frequentemente envolvidos precisamente porque estão psicologicamente e financeiramente no seu mais vulnerável. Eles são facilmente explorados por uma indústria dirigida por sua habilidade de manipular aqueles mais provavéis de não possuir escolhas reais na vida. De fato, as vidas e experiências deste homens gays jovens são bem removidas da "fantasia" que evocam.
É um reflexo perturbador do estado das relações de homens gays que é tão pouco conhecido, e no final feito para ajudar, os homens tidos como imagens de onde identidade gay masculina é derivada. Note, por exemplo, a descrição de um homem jovem (entrevistasdo em 1985) envolvido na produção de filmes e revistas pornograficas gays.
Jim Y. foi criado por pais alcoolicos, abusivos. Quando Jim contou ao seus pais que era gay, aos 13 anos, seu pai tentou o matar com uma larga faca de cozinha. Jim saiu de casa aos 17. Aos 19 conheceu Frank H, mais ou menos 10 anos mais velho, quem virou seu amante. Frank estava envolvido em um filme porno quando conheceu Jim, e convenceu Jim em aparecer nele. Jim interpretou um recem chegado a cidade grande que se envolve em S&M, incluindo lamber de botas, bondage, bater com cinto, fisting, e assassinato implicado. Este filme foi o primeiro filme a mostrar fisting e Jim diz que ele está convencido -que isso criou interesses gays em fisting como comportamento sexual. O filme também refletiu o relacionamento S&M que Jim e Frank iriam dividir na próxima década. Jim está vendo um psiquiatra a três anos agora. Ele tem tentado evitar sexo S&M, e acredita que seu comportamento sexual foi uma manera de buscar contato com seu pai abusivo. Ele também reconhece que muita "fantasia" sexual pode ser destrutiva; quando perguntado de onde vem, ele disse, "Bem, de alguma forma, de mim; dos meus filmes, isto é." Há um mês atrás Jim foi diagnosticado com AIDS, e agora teme ter perdido qualquer chance que poderia ter tido de reverter sua vida.




A realidade diária dos homens jovens usados em pornografia gay masculina deveria, no minimo, indicar que a indústria não ofereçe proteção às pessoas que ela usa para lucrar. Muitos desses homens, já suscetíveis aos efeitos de emocionais, físicos e sexuais abusos passados, são postos em perigo por um indústria que, até hoje, fez pouco se fez algo para promover práticas sexuais seguras e, como resultado, faz muito pouco para proteger as pessoas que deveriam apresentar práticas sexuais seguras e positivas. Em adição, a indústria está inerente à prostituição destes homens, resultando em risco crescente de exposição à AIDS e violência física e exploração comensurada com prostituição em geral.
De forma similar, não requer muita investigação para perceber que cenários de violência sexual e dor apresentados como prazerosos são de fato documentações de degradação real, que não são nem prazerosas nem ficticias. Enquanto é fácil articular uma teoria de libertação que fecha os olhos ou ignora a realidade do que é especialmente apresentado como "fantasia", o uso e abuso de homens jovens em cenários de degradação, desumanização, e violência não podem ser justificados, particularmente por aqueles que vêem sua apresentação como integral à realização sexual e política de todos os homens gays. Como LEAF tão certamente argumenta em Butler, se alguma coisa violenta a liberdade e integridade de uma pessoa que o abuso sexual e físico direto, é a venda em massa deste abuso como entretenimento sexual.

A comunidade gay masculina tem sido relutante em aceitar que homens gays de verdade machucam uns os outros, que isto pode ser encorajado por pornografia ou que há algo inerente nos valores expressados na pornografia gay masculina que mina igualdade. Se estas publicações gays masculinas fossem heterossexuais em natureza, no entanto, e apresentasse mulheres e homens ao invés de homens e homens, as cortes canadenses iriam aceitar que são substancialmente danosas às mulheres e sociedade, baseado em pesquisas que indicam que produção e distribuição de pornografia heterossexual aumenta os riscos de violência contra a mulher e que esteriótipos e hieraquias de gênero promovidas em pornografia minam igualdade. A última década de pesquisa adicionalmente indica que pornografia heterossexual causa danos ás mulheres por negativamente influenciar comportamento individual ou grupal e por ser usada como ferramenta para forçar pessoas à participarem em relacionamentos não-consensuais, não-igualitários.
Estes danos resultam de pornografia gay masculina também? Ou o "gay" em pornografia gay masculina faz a pornografia menos pornográfica? Isto é, há algo qualitativamente diferente sobre as fotos de homens violentando outros homens que faz pornografia gay masculina livre de dano, ou fora dos limites de Butler?
Embora pesquisa até então contou apenas com pornografia heterossexual, eu sugiro que este achados são igualmente aplicáveis à pornografia gay masculina -- isto é, que a apresentação de pessoas reais em cenários de violência e degradação (sem mencionar a exploração involvida na produção destas imagens) podem neste caso, também, levar a violência aumentada contra pessoas reais. Eu não argumento que o dano ou o nível disso são exatamente os mesmos, já que homens não estão socialmente na mesma posição que mulheres. Mas uma analogia pode ser tido-que em ambos os casos certas imagens causam comportamentos que danem pessoas reais.

Apoiadores de pornografia gay masculina irão responder que pornografia heterossexual é danosa porque mostra homens causando danos à mulheres--que é a diferença biológica que deixa mulheres não-seguras e não-iguais. Então, pornografia gay masculina elimina o risco de dano porque nenhum mulher figura sua apresentação. Qualquer análise que descansa em biologia, no entando, é enganosa, como essencialista. Assume que quando homens machucam e violentam outros homens não é danoso -- uma presunção que somente reinforça presunções dominantes sobre comportamento masculina aceitável e agressão masculina em geral. Mais importante, o perigo inerente em pornografia heterossexual não é sua apresentação do homem biológico violentando a mulher biológica. A legitimização do poder de aqueles que apresentam agressão e dominância reinforçam violência masculina e inegualdade sistemática para aqueles que se tornam suas vítimas.
A masculinidade apresentado em pornografia não é de fato biológica mas um traço social. Dois homens podem ser feitos não-iguais se um homem é visto como um homem de verdade e seu parceiro não. Pornografia gay masculina, como pornografia heterossexual, cria uma hieraquia de gênero em que masculinidade se iguala a poder. Ela promove dominância masculina, e isto, em retorno, resulta em dano considerável.
No seu estudo revelador de 1991 em violência doméstica masculina gay, Island e Letellier reportarem que há entre 350.00 a 600.00 vítimas de violência gay doméstica masculina nos estados unidos a cada ano, o terceiro maior problema de sáude afetando homens gays no país hoje. O que é mais interessante para uma análise de pornografia gay masculina são os achados do estudo sobre os tipos de homens que batem e como percebem a si mesmos e seus parceiros.

Homens gays que batem e abusam de seus parceiros tem idéias específicas sobre masculinidade e o que significa ser homem. Este é o resultado da quase completa falta de exemplos positivos gays, um ambiente homofóbico em que ser gay significa ser não-masculino, veja inferior, e a internalização de auto-ódio e rejeição societal. Estes homens compensam por seu senso de não-valia ao procurar sistemas de valores que esperam irão oferecer poder de controle, e mais aceitável socialmente. Os batedores masculinos gays no estudo interpretam assertividade como significar agressão (ignorando os direitos e sentimentos dos outros), pensem da força como licença para serem violentos, vêem poder como uma licença para aterrorizar, e vêem mutualidade como uma ameaça. Como Island e Letellier explicam, batedores gays masculinos "performam" o que percebem ser comportamento masculino apropriado, seguem uma receita para aquela masculinidade e quando batem em seus parceiros, desculpam seu comportamento em clamar que isto é apenas como homens agem.
Pornografia gay masculina promove "valores" como poder, brutalidade, e não-mutualidade, exatamente os mesmo tidos por batedores gays masculinos. Pornografia gay masculina então apoia e sexualiza uma visão de masculinidade que resulta diariamente em homens gays sendo abusados e assassinados por homens que os amam.
Enquanto nenhuma pesquisa foi feita para determinar se homens gays que abusam seus parceiros usam pornografia gay, não há evidência que não o fazem. Para muitos advogados pró-porno, pornografia gay masculina serve como um recurso de aprendizado, particularmente em uma sociedade que expressão gay masculina é oprimida. Para estas pessoas eu pergunto se é razoàvel em assumir que um recurso de aprendizado que promove masculinidade, levada a seu extremo, uma vez interpretada por homens que sentem que não se encaixam na norma desejada e sentem que devem, tem o potencial de liberar já sentimentos intensos de insegurança e resultam em alguns comportamentos particularmente destrutivos.

Na soma, pornografia gay masculina encoraja tudo o que é masculinidade (leia "homem" socialmente definido). Logo, em adição de encorajar agressão masculina resultando em dano físico, vai longe também em manter inegualdade sistemática ao promover ao invés de minar uma hierarquia de gênero em que "masculino" é top e "feminimo" (leia todas as mulheres e aqueles homens gays que caem ou escolhem não se conformar com a construção masculina e quem são então socialmente feminizados) é bottom. Como pornografia heterossexual, ela então glorifica aqueles que em nossa sociedade sempre tiveram o maior poder e quem se beneficiou de dominância masculina e inegualdade social: homens heteros de corpos definidos, brancos. O resultado para a sociedade é uma política sexual baseada na dicotomia homem/mulher, uma divisão entre o poder e os sem poder, top e bottom.
Ao referir a homens gays como feminizados e então "femininos", eu não estou sugerindo que homens gays e mulheres são igualmente oprimidos. Como Andrea Dworkin explica, "homens desvalorizados podem geralmente mudar de status, escapar, mulheres e garotas não podem." Nem estou sugerindo que todos homens gays são igualmente oprimidos. O que estou dizendo, no entanto, é que a qual extensão homens gays rejeitam comportamento masculino socialmente definidos (como devem se igualdade sistemática terá que ser obtida) e expressam sexualidade e políticas que tem o potencial de subveter supremacia masculina, seu comportamento é tido inaceitável e desvalorizado como tal. O homem gay que o faz é então, como John Stoltenberg explica, "estigmatizado porque ele é percebido no status degradado de feminino" e, como tal, assume uma posição inferior àqueles que, não feminizados, arrancam os benefícios da polaridade homem/mulher. Ele é, em essência, penalizado por não "mudar de status" -- isto é, por não adotar aqueles valores e atitudes que mantém dominância masculina e a inegualdade que resulta disso.

Escritora lésbica e ativista Suzanne Pharr escreveu que quando homens gays quebram com os ranques de modelos masculinos atráves de aproximação mútua e mostram afeição por outros homens, eles são percebidos como não serem "homens de verdade" e são identificados com mulheres -- o "sexo mais fraco" que deve ser dominado, e que é objeto de ódio e abuso masculino. Misoginia, ela explica, é transferida para homens gays como vingança. É aumentada pelo medo mainstream que identidade gay sexual e comportamento irão desafiar dominância masculina e heterossexualidade compulsória. O homem gay, socialmente feminizado, internaliza sua misoginia e procura imitar aqueles comportamentos que irão, ele acredita, permitir que ele passe por o que um homem deve ser. Masculinidade, para aqueles que foram penalizados por não encontrarem seus critérios, promete privilégio e uma rede de proteção na qual encontrar apoio e aceitação.
Esta rede de proteção assumida é exatamente o que faz pornografia gay a ameaça homofóbica à igualdade que é. Ao invés de encorajar homens gays de subverter construções de gênero opressivas, ela diz a homens gays que todo relacionamento sexual deve ser hierárquico e que poder masculino está no topo da hierárquia. Ela promete homens gays o falso senso de seguridade que ele pode também obter mais poder se ele se tornar aquilo que epitomiza poder-masculinidade a seu extremo. Infelizmente o poder prometido é uma fachada e faz um grande serviço em manter dominância masculina-a própria fonte de tudo que é anti-gay, anti-mulher, anti-igualdade.
Autor gay Seymour Kleinberg argumenta que um não vence o inimigo de um apenas o imitando. Mímica apenas assegura invisibilidade. Por dissuadir a expressão pública de uma sexualidade que tem o poder de minar patriarcado, pornografia gay masculina serve como um pouco mais de outra fonte homofóbica para silenciar homens gays e reinforçar já profundo concreto sistema de discriminação sexual e inegualdade social.

Homens gays dizem com convicção que "silêncio iguala morte". Para muitos, isto representa uma chamada para ação. Para estes mesmos homens eu digo: silêncio iguala morte, e pornografia gay masculina é a sua focinheira. Agora me deixe ver ação de verdade.

Cristopher Kendall

sábado, 15 de dezembro de 2007

Teoria Queer e Violência Contra a Mulher

março 2004 - Por Sheila Jeffreys

Eu quero falar sobre como queer e teoria pós-moderna afetaram a habilidade de feministas e lésbicas de organizar-se contra, ou mesmo reconhecer violência contra mulheres. Na teoria queer e pos moderna, baseada no individualismo liberal, formas importantes de violência são renomeadas ´transgressão´, ´escolha´ ou ´agência´. Eu vou concentrar nas 3 formas de violencia aqui, a prostituição de homem abusando de mulheres, a violência de operações transexuais e a violência da industria da modificação corporal.
Meu ponto de partida é aquele velho mas pouco compreendido slogam feminista: ´Nosso corpo nós mesmas´. Em relação à violência, eu sugiro, isso tem dois importantes significados:


1/ A objetificação de mulheres no qual os corpos são tratados como objetos para outros usarem, à revelia de nossa vontade ou pessoalidade, como em estupro, abuso infantil, prostituição, são danosos para nós mesmas. O que é feito aos nossos corpos afeta a nós. Para sobreviver aos usos abusivos ou violentos de nossos corpos nós temos que aprender a dis-associar* para sobreviver. Em relação a prostituição o entendimento de ’nosso corpo, nós mesmas’ nos capacita reconhecer o mal da dis-associação que mulheres prostituídas tem de fazer uso de forma a sobreviver a violação de seus seres é constituiída pela violência sexual comercial.


2/ O slogam ’Nossos corpos, nós mesmas’ também significa que nossos corpos não são o problema. Esse foi o entendimento que deu base aos grupos nascentes de conscientização que capacitaram tantas mulheres a aceitar o formato de seus corpos e abrir mão de maquiagem e outros disfarces. Os problemas que mulheres e homens podem ter com as formas de seus corpos, configuração genital, são politicamente construídos em uma sociedade de supremacia masculina na qual mulheres, e alguns homens, são sexualmente e fisicamente violados por homens, na qual construções de gênero e de corpo perfeito são usadas para reinforçar controle social e a criação de uma dominação masculina e subordinação feminina. Descontentamento com nossos corpos que surge dessas condições políticas é um problema político, e a mutilação de corpos é uma ação que visa cortar fora os corpos para fazê-los caber dentro de um sistema político abusivo ao invés de procurar mudar o sistema para caber os corpos que de fato as pessoas têm.

Um valor básico feminista é a criação de uma sexualidade da igualdade na qual nós podemos permanecer em nossos corpos e celebrá-los como o são.

Em condições de opressão nenhuma dessas coisas é fácil. Nos anos 80 houve um backlash (reação) contra esses entendimentos fundamentais do feminismo. Feministas que trabalhavam em pornografia, em abuso sexual, em maquiagem, em sapatos de salto alto e outras belezas prejudiciais foram então tachados de: politicamente correto, puritanismo, anti-sexo.

As forças que alimentaram esse backlash:

1/ Liberalismo. O ponto de partida de feministas radicais que restringiram a compreensão de políticas para o mundo público, ganhou status nos 80 e 90. O ponto de vista de feministas liberais estadunidenses como Katie Roiphe e Naomi Wolf, e a jornalista britânica Natasha Walters, tão amada dos editores e da mídia, que mulheres são igualmente empoderadas o bastante para lidar com todos esses inconvenientes de suas vidas privadas, assédio sexual, estupros em namoros, espancamento, fazer todo trabalho de casa, de fato se torna exatamente como o liberalismo que dá suporte a políticas queer e pós-modernas.


Mulheres precisam ser ’power feminists’ [feministas empoderadas] diz Naomi Woolf. Nós estamos livres para usar maquiagem mas é supreendentemente certo de que são ainda mulheres que estão escolhendo essa forma de empoderamento. Aparentemente há um nível de campo lúdico mas homens não estão se aglomerando para retirar suas olheiras, usar batom, sapatos torturantes e saias curtas apertadas.

Práticas de violência são justificadas sob a rubrica do consenso. Sadomasoquismo, prostituição e cirurgia plástica não são compreendidas como práticas de opressão criadas através de relações de poder desiguais em supremacia masculina. Elas são portadas como invenções femininas para o prazer de mulheres ao invés de práticas tradicionais danosas.

A fetichização de consenso e escolha e seu set aplicado a estupro em namoros, é adotado de maneira ardente por pós-modernistas e teoristas queer que promovem sadomasoquismo e prostituição, transexualismo e body modification como o máximo em auto-realização e empoderamento.

2/ Pos-modernismo. Um set de idéias criado marjoritariamente por homens gays e em geral ininteligível. Homens intelectuais franceses vêm sendo adotados com aparente entusiasmo por muitas acadêmicas feministas e teóricos queer nos anos 80 e 90. Essas idéias foram sendo empregadas eu sugiro que seja porque algumas mulheres e homens gays queriam carreiras acadêmicas que são bastante difíceis de sustentar se você manter uma perspectiva feminista radical. Apenas as idéias de homens respeitados por outros homens farão você ir longe na acadêmia. Então feministas e homens gays vestiram as idéias do sadomasoquista Michel Foucault, por exemplo. Ele se tornou mais popular que Marx era nos 60 entre os trendies e progressistas. Em muitos departamentos como os de estudos culturais ele esteve e é compulsório.

O que essas idéias contribuiram para feminismo e o entendimento da violência? A idéia de que não há algo do tipo ’mulher’. Que isso é essencializante, e inaceitável é falar da experiência de mulheres ou opressão das mulheres porque mulheres são todos indivíduos completamente diferentes. Opressão adicional não existe porque poder apenas flui sem direção, apenas constantemente recriando a si mesmo nas interações de pessoas bem intencionadas, na comunicação. Não há algo como ’verdade’, o que convenientemente permite um relativismo moral no qual é bastante fora de moda protestar contra qualquer comportamento ou condição de opressão.


Essa é uma teoria espetacularmente inadequada para analisar violência e assim, graças a isso, não muitas feministas pós-modernas tentam fazê-lo. Elas estão mais interessadas em mídia, representações e fantasia, não em comportamento real ou circunstâncias materiais. Quando elas se aproximam de violência os resultados são bizarros. Sharon Marcus sobre estupro nos diz que estupro ocorre porque mulheres erraram no script. Se mulheres forem capazes de mudar o script então homens não as estuprariam. Isso desloca a culpa pelo estupro de volta às mulheres, algo que feministas tiveram sempre tentado mudar. Shannon Bell nos conta que não há ’significado inerente’ para prostituição. Se fosse o caso de que prostituição não possui significado em termos de relações de poder, então homens estariam se alinhando nas ruas para serem pegos em carros por mulheres que desejariam defender as coisas no seu âmago. É realmente difícil de sobrever assim as relações de poder na prostituição mas pós-modernistas podem fazê-lo.

Feministas pós-modernas nos dizem que o corpo é um texto. Não verdadeiramente real, mas um texto que pode ser rentavelmente reescrito. Então feministas pós-modernas são usadas pra justificar body modification. O ezine de body modification tem artigos justificatórios que citam teóricas ’feministas’ como Elizabeth Grosz e Judith Butler para legitimar as práticas anunciadas nos websites, tanto que página após página de propagandas de diferentes estúdios de piercing e cutting de todo o mundo ocidental com fotos de suas mercadorias. As fotos mostram partes na maior parte de corpos de mulheres lacerados, costas esfoladas abertas, músculos de carneiros com desenhos grandes e sangrentos neles cortados, estômagos simplesmente cortados sem qualquer desenho particular. As webpages muitas vezes portam bandeiras do arco-íris e o slogam ’assumida e orgulhosa’. Essas jovens lésbicas estão apenas reinscrevendo o que nós fomos orientadas.

3/ Teoria Queer. A teoria queer adapta s idéias dos pós-modernistas para os interesses de alguns homens gays. Elas são usadas para re-nomear formas variadas de violência como sadomasoquismo e transexualismo como ’transgressão’. Teoria queer é grande na importância da ’transgresssão’ das fronteiras corporais o que acaba por significar carregando formas de violência em cima disso. O entusiasmo com ’transgenerismo’ muitas vezes dito ser diferente de transexualismo também requer maior reformatação do corpo ofensivo com substâncias químicas se não cirurgia atual. Em teoria queer mulheres prostituídas são transformadas em uma minoria sexual, ou em um ’movimento de afirmação’ junto com outros praticantes ou vítimas de violência como sadomasoquistas, pedófilos, transexuais e vistos como rebeldes criando um novo futuro sexual. De fato, claro, mulheres prostituídas estão tendo que dis-associar para sobreviver, e não sendo liberadas sexualmente. Estão servindo à liberação sexual de seus colonizadores, os homens.

De fato as práticas de violência que são celebradas em teoria queer podem todas ser vistas como resultantes da opressão. Mas teoria queer, sendo baseada em individualismo liberal, não reconhece as políticas como sendo concernentes ao templo do privado. Sexo é privado e além das análises apesar de que as políticas queer demandam que homens gays sejam empoderados para clamar largas áreas do espaço público nas quais pratiquem seu sexo ’privado’. Essas áreas nas quais mulheres são feitas se sentirem desconfortáveis ou nas quais sejam feitas parecer muito perigosas para mulheres se aventurarem, por causa do delicioso senso de medo e apreensão que homens gays criam em campos de caçada por silenciar e rondar estão agora sendo oficialmente designadas como ’ambientes de sexo publico’ por exemplo nas políticas de HIV nas cidades escocesas. Logo homens gays apropriaram-se de largos pedaços de parques, fontes, ruas como sua possessão própria.

Políticas Queer nas formas de grupos como Sex Panic [Pânico Sexual] nos EUA e Outrage [Ultraje ou numa leitura dúbia, Raiva pra Fora] no Reino Unido, milita pelos direitos individuais de homens gays para injuriar outros em sadomasoquismo para seu entretenimento, a usar garotos em prostituição e pornografia, de adquirir espaço público para suas práticas. Um homem foi recentemente condenado por assassinato em Melbourne por enforcar outro homem na prática sadomasoquista de asfixiamento. Esse homem, proeminente em sadomasoquismo gay em Melbourne, um businessmen do sadomasoquismo associado com gerenciar clubes de SM para lucro, roubou os cartões de créditos do homem morto e seu carro e fugiu para o norte em Queensland. O bom é que ele pegou 5 anos de prisão. Minha perspectiva de todas essas práticas de violência sobre eles como sadomasoquismo, transexualismo e mutilação é que os perpretadores estão sempre errados. Não importa o quanto alguém peça para ser abusado é ainda assim errado complacer e é particularmente chocante fazer lucros em cima disso.

O que liberalismo e suas formas mais fashionáveis em pós-modernismo e teoria queer vem fazendo é desaparecer o opressor. Todas práticas de violência são vistas como ’escolhidas’ por agentes desejosos de, e visto também como politicamente progressivo e transgressivo.

Práticas Tradicionais Prejudiciais

Eu quero procurar com mais detalhismo de onde essas práticas de violência surgem e sugerir que elas de fato deveriam ser reconhecidas como práticas tradicionais prejudiciais. Em 1995 os Estados Unidos publicou indicadores de ’Praticas Tradicionais Prejudiciais e seus efeitos na saúde de mulheres e crianças’. As práticas descritas pelos indicadores sociais eram quase todas não-ocidentais. Elas incluíam mutilação genital feminina, casamento infantil, preferência do filho, alimentação forçada. A única prática listada que claramente dá cobertura também às culturas ocidentais é violência contra mulher e nessa prática está incluida prostituição.

Eu penso que é uma maneira bem útil de entender prostituição assim como as outras práticas de violência que eu venho discutindo aqui. Prostituição cabe muito bem dentro do critério de reconhecimento de uma prática tradicional prejudicial como definida pela UN.

1/ Prejudicial para a saúde de mulheres e crianças : Isso é certamente prejudicial para a saúde de mulheres e crianças pelo dano à auto-estima, tendências suicídas e auto-mutilação, doenças sexualmente transmissíveis e HIV, dano aos sistemas reprodutivos, gravidez indesejada, uso de drogas pra aguentar a violação e para prender mulheres e crianças à cafetões e bordéis.


2/ Emerge da subordinação de mulheres : prostituição claramente surge da subordinação das mulheres. É uma prática na qual as vítimas são mulheres e crianças expostas e os perpretadores são quase totalmente homens através da história e culturas. Essa é uma prática que explora o despoderamento de mulheres e crianças, economicamente, fisicamente e em relação com dominação masculina adulta e a submissão de mulheres e crianças.


3/ Suportada pelo peso da tradição : prostituição é frequentemente descrita pelos apologistas como ’a profissão mais antiga’ o que, longe de ser uma justificação, de fato poderia ser vista como uma particular acusação das sociedades ocidentais presentes que aclamam a si mesmas progressivas e comprometidas com igualdade embora mantenham séculos de velhas formas de escravidão em relação a mulheres e crianças.


4/ Toma uma aura de moralidade : uma vez que é fácil ver em relação à tais práticas de mutilação genital feminina desde envolvimento de mulheres na prostituição tem tradicionalmente levado a punição e isolamento social, é possível ver prostituição ganhando uma aura de moralidade agora com sua legalização em muitos países incluindo Victoria na Austrália onde eu vivo. Quando o relatório ILO (1) do último ano em prostituição chamado ’O Setor Sexual’ chamou pelo reconhecimento da utilidade da prostituição para as economias da Ásia Sudeste então o status de prostituição como uma indústria se não de mulheres prostituídas por si mesmas, está mudando rapidamente. Certamente prostituição se não sempre vista como moral é vista como inevitável na maior parte dos países do mundo e isso mostra a natureza profundamente enraizada de sua aceitação, sua implantação nas culturas de dominância masculina.


5/ Escolhida e infligida sobre mulheres por si mesmas: apesar disso não estar no critério oferecido pela UN de práticas tradicionais prejudiciais Eu penso que é um elemento importante da maioria deles, excluindo reconhecida violência masculina como em estupro de crianças e violência doméstica. Em muitas das práticas nas quais mulheres e crianças do sexo feminino são preparadas para o casamento e escravidão sexual, mutilação genital feminina, alimentação forçada etc. mulheres são as torturadoras de outras jovens mulheres como Mary Daly apontou em sua análise dos sado-rituais que concordam muito bem com o que a UN agora chama de práticas tradicionais prejudiciais. Homens são removidos pra longe da paisagem e sua responsabilidade difícil de ser reconhecida. Em algumas práticas, como na queima de viúvas em Rajasthan, mulheres são vistas como abraçando a morte voluntariamente a morte na pira funerária de seus maridos. As culturas qme que essas práticas são tocadas criam pressões sociais tão forçosas que recusa parece impossível e ’escolha’ é inimaginável. Em culturas ocidentais mulheres são vistas como livremente escolhendo prostituição enquanto os abusadores masculinos são invisíveis. Isso pode quase ser visto como se mulheres fossem para dentro dos quartos e fizessem a prostituição toda por si mesmas. Os homens precisam permanecer invisíveis como se o mal social de seu comportamento de prostituição para com as mulheres que eles tem relacionamentos fosse pra ser escondido. Em Victoria agora nós estamos ouvindo mais e mais histórias de mulheres cujo casamento de 25 anos ou mais foi destruído pelo comportamento de prostituição de seu marido, comportamento que ele vê como justificável num estado no qual prostituição é uma empresa estatalmente licenciada, regulada e taxada que exibe suas mercadorias no centro de exibição do estado. A dor das mulheres na descoberta, repentina, de fotos de jovens moças nuas da mesma idade de suas filhas integradas com os feriados familiares estala e vai pensando na agonia de serem culpadas pelos parentes por não dar aele o bastante, perdendo a lealdade das crianças que tomam partido do pai abusivo. Tudo isso é o mal de uma escala massiva que está institucionalizada pela legalização da prostituição.

6/ Justificada com as ideologias dos homens : Mary Daly também, fala de como os sado-rituais são justificados e celebrados nas ideologias masculinas e nas academias. Isso é onde entra as ideologias que eu venho observando aqui, as ideologias que consentem com ou legitimam práticas de violência, liberalismo, pós-modernismo e teoria queer.

O ocidente tem uma cultura em que práticas de violência e opressão são escondidas, responsabilizadas nas vítimas pelas idéias de ’escolha’ liberal ou celebradas. Eu gostaria de acrescentar lésbicas e gays às constituições opressivas que são as vítimas das práticas prejudiciais tradicionais. O status oprimido de lésbicas ou homens gays, combinadas com a experiência de violência sexual de homens na infância, está construindo eles como constituintes das indústrias de transexualismo e modificação corporal na qual histórias dolorosas são literalmente cortadas dentro dos corpos das vítimas para enlucramento. Transexualismo tem uma longa história. Muitas culturas tem escolhido construir uma dominação masculina cuidadosamente regulamentada e uma subordinação feminina por convocar em uma terceira categoria aquelas crianças masculinas que não cabem nelas ou são desejadas por outros homens para uso em prostituição. Isso não é uma história ilustre mas uma história de opressão, a qual queremos pôr um fim.

Automutilação (cutting), piercing e tatuagem, infelizmente, não são apenas moda. Para muitas vítimas de violência sexual e opressão de lésbicas e gays cutting se tornou uma obcessão, uma forma de carregar pra fora deles com a égide da aceptabilidade a auto-mutilação que eles poderiam de outra forma performar com culpa em seus próprios quartos. Penectomias, a perfuração de gargantas, facas perfuradas estreitamente pelos corpos, tatuagens faciais, tem repercurssões. Elas são potencialmente fatais, afetam prospectivas de emprego, podem levar a perda de poder de fala, infecções por HIV e muitos outros riscos. Cortar-se leva a gente pra um caminho longe do insight original feminista de Nossos Corpos Nós Mesmas, que eles são bons e legais e não merecem violência, constrição, ser escondidos com maquiagem ou véus, lacerados com cirurgia plástica ou operações transexuais. As práticas de violência que eu tenho olhado aqui, prostituição, transexualismo, cutting, sugerem que a brutalidade da opressão da mulheres, crianças, lésbicas e homens gays nas culturas ocidentais nas quais os oprimidos tem que dis-associar ou irrelevar pra sobreviver. Mas esses liberais que querem-nos acreditando que nós vivemos no melhor de todos mundos possíveis, abençoado com uma posição num campo de jogos de iguais oportunidades, devem culpar essas práticas nas vítimas através das idéias de escolha, ou distorcer seus significados ou celebrá-las através das ideologias queer ou pós-modernas. No Canadá hoje, como na Austrália práticas tradicionais prejudiciais de violência estão vivas como nunca e a gente precisa estar habilitada pra identificar elas claramente e em opôr-se, sempre, a quaisquer tentativas de justificá-las ou de construir indústrias rentáveis em cima delas. Estúdios de auto-mutilação, bordéis, deveriam ser como impensáveis assim como a idéia de construir indústrias em cima de mutilação genital feminina (apesar de que,claro, revistas de modificação corporal usarem fotos de garotas e mulheres mutiladas para a satisfação pessoal dos homens).


Notas
(1) Lim, Lin Lean (ed), The Sex Sector : the Economic and Social Bases of Prostitution in Southeast Asia, International Labour Organization, Geneva, 1998.
Janice G. Raymond,
Legitimating Prostitution as Sex Work : UN Labour Organization (ILO) Calls for Recognition of the Sex Industry Part One and Two, December 1998.


Referências
Mary Daly, Gyn/Ecolgy - The Metaethics of Radical Feminism Boston, Beacon Press, 1978, 1990.
Sheila Jeffreys, Unpacking queer Politics, Cambridge UK, Polity Press, 2003.
Sheila Jeffreys, The Lesbian Heresy, Melbourne, Spinifex Press, 1993.
Janice G. Raymond, The Transsexual Empire, New York, Teacher’s College Press, 1979, 1994
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Apresentado em Vancouver Rape Relief fundraising dinner, 24 Setembro de 1999.
© Sheila Jeffreys


* Dis-associação ou Aprendendo a Dis-associar: Muitos sobreviventes de trauma são familiares com dissociação. É uma habilidade primária usada para encobrir sentimentos. Algumas pessoas com repetidas experiencias de eventos traumáticos particularmente na infância, aprender a dissociar bem cedo na vida. Dissociação significa escapismo mental e emocional quando fuga física não é possível Por exemplo, dissociação significa não permitir a situação dolorosa adentrar a consciência. Também pode significar bloquear seu impacto emocional por compartimentalizar o trauma. Isso permite aos sobreviventes desatachar-se do evento traumático, ajudando a desviar do seu impacto total. Se você dis-associar, você pode estar perdendo tempo, tempo que você não poderá contar ou tempo no qual você não estará certo de suas ações. Quando um evento é encobrido, ou quando esse evento é muito doloroso para tolerar, é natural e auto-protetivo aprender a dis-associar.[ Life After Trauma: A Workbook for Healing by Dena Rosenbloom, Mary Beth Williams